sexta-feira, 29 de maio de 2009

tiplati tuguédis

Era tempo dos afonsinhos quando ele vestiu o terninho de marinheiro pra deixar a mãe orgulhosa. Lá se foi pra rua de nó azul e uniforme branco alvo. Alvo branco. O pobre nem imaginou que na primeira saída a inveja dos meninos da Capote Valente iria acabar com a festa. Mal virou a esquina do quarteirão de casa e as três filhas da vizinha já gritaram pro povo todo olhar pro pequeno oficial enlameado. Eram três irmãs, a Ana e a Clara... a terceira não se lembra mais. Mas recorda bem a surra que tomou da genitora, possuída pelos prantos da decepção. Nem conseguiu explicar o sucedido. Antes tivesse sido uma queda do carrinho de rolimã.

Depois veio a fase de a turma arrumar apelidos pra ele. Alicate, por causa das pernas curvadas, e Cabeção, graças à cuca grande, eram os prediletos. Um dia, talvez ainda amargurada por conta do terninho perdido, a mãe pediu que ele fosse à feira: “Traz três melões, duas mangas rosa, um quilo de laranja, uma melancia...”. E enquanto o rapaz buscava a sacola pra carregar a encomenda, foi disparada a acidez materna: “Traz no gorrinho mesmo!”, e explodiu em gargalhada.

Engana-se quem pensa que ele cultivou revolta, ou entrou metralhando na escola, ou tentou suicídio quatro vezes, ou ainda tenha virado sacerdote, transexual ou usuário de heroína. O que deu sentido a sua existência foi a aquisição, com o passar dos anos, de um repertório boca suja invejável. Tinha palavrões para todas as ocasiões, conferindo a tais termos novos significados a cada combinação e entonação. Foi o rei do baixo calão, no melhor sentido possível, pois foi assim que se socializou aos montes, passou a ser considerado, conquistou simpatias e, logo, já andava malemolente como um milongueiro boa praça pelos botecos de São Paulo.

E assim aprofundou sua crença no comer, beber, gargalhar e proporcionar o riso. Os ocorridos da infância não viraram traumas. Talvez nem tenham existido de fato. Quem sabe? Vai ver só foram reavaliados e reinventados por ele, e agora por mim, para que virassem bons pretextos para mais anedotas e para a criação de incríveis neologismos com as boas e velhas palavras chulas.

E eu, como neto desse cara, só tenho a agradecer e encher a boca pra dizer: “No cu, braboleta!”

quarta-feira, 27 de maio de 2009

trampando nas nuvens

Sempre comentei a respeito dos trabalhos que fazia pra TAM. Entonces, pra quem tem curiosidade, essas são compilações dos 2 últimos meses, antes da minha saída desse projeto. Muitas dessas matérias produzi, algumas roteirizei e outras dirigi. Dá um confere aí que tem umas voyages ótimas.




Nesse de cima tem umas ceninhas de uma matéria sobre os bastidores da seleção, gravada lá em Porto Alegre, antes do jogo contra o Peru, que assistimos de dentro do campo. Tem também um pequeno pedaço da entrevista feita em Paris com o bon vivant e autointitulado vagabundo francês Pierre Barouh, que fez aquele documentário maluquíssimo chamado Saravah, com a participação de Baden, Paulinho da Viola e Bethânia nos primórdios e de Pixinguinha e João da Baiana nas últimas. Recomendadíssimo esse filme! Nesse programa tive também um papo
sobre os novos quadrinistas brasileiros com o cartunista genial Laerte, que não aparece aí.




Viagem batuta demais pela parte francesa do velho mundo... Parrí, Vale do Loire e talhe coisa e coisa tal. Tem também uma amostrinha da matéria sobre a nouvelle vague, que contou com o cineasta
"maldito" Claude Lelouch. E não menos importante e delicioso de fazer, um teco ínfimo do vídeo de destino turístico sobre o Maranhão, que teve direito a passeio histórico, doce de espécie, sobrevôo nos Lençóis, macaco na cabeça e outras pedras de remponsa. Ah, tem a entrevista que fiz com o pianista Phillipe Baden Powell, que como o nome acusa, é filho do hômi.

Mais pra frente postarei uns e outros quadros completos, com o diário de bordo e tudo o mais. Xá só eu resgatá-los. Simba!

quarta-feira, 20 de maio de 2009

pequetita?


do vidro do trabalho,

emoldurado pela tela, ______________dois prédios de escritório

e o batente da janela,

avisto um recorte da breguice da Daslu

e, imantadas por ela,

as hélices rompem o pôr do sol

tão bonito de fumaça,

incitando as copas sem praças

e ampliando o ohmnmnmn do mantra urbano

e a visão inebriada, e o sono...

das meninas tietes na porta da Via Funchal

com seus travesseiros, edredons e badalhocas

sob o aroma de por quilo e dobradinha de padoca

dvds piratas estão em oferta e o pagamento é à vista

três por dez

dez por vinte

seis em cada sete taxistas,

como se pescassem com varas e anzóis,

discutem futebol, lêem Destak e falam mal dos motoboys,

que por sua vez,

rosnam e rebolam suas caixas

apagando a tinta das faixas

mas das onze às seis

o trânsito não é lá tão ruim,

apesar do protesto com apitaço e narizes de palhaço

contra alguma firma nem tão firme assim

nos vãos das______persianas, dos ______,,óculos,

das________________ xanas,

desfilam celulares, laptops, catracas,,,,,,,,,,,,,,,crachás, ipods, gravatas,

comandas, blackberrys, convênios

e gêmeas, gêmeos...

Nunca vi tantos gêmeos!

segunda-feira, 18 de maio de 2009

ok, ok, que história é essa de Gorgonzola


Antes de tudo, o referido pasteurizado é uma dádiva, uma descoberta incrível do homem. Talvez a maior depois do silêncio – e do barulho, já que é ele quem legitima a pausa –, da risada, da batata, da arara e, pra ser correto, do amor. Diria mais, ele é por si só, uma alegoria inexpugnável (essa é pro Pán) da própria existência humana. Não seria a vida um processo incessante de maturação?

O Gorgonza, intimamente falando, é de uma riqueza simbólica incrível, quase uma tortada na cara. Fedido para leigos comportados e conformados, cheiroso para ousados cheios de apetite. E cabe aos que reconhecem seu sabor divino e robustamente intenso, acatar os fungos anis esverdeados e marrons azulados... assim como na vida e suas fortes emoções. Para o bem e para mal! E o pior – ou o melhor –, é que são eles, os fungos, que dão a graça da aventura gustativa e, peito aberto aos paralelismos!, garantem a reelaboração da própria vitalidade.

Pra ser direto, há que se saber saborear esse misto de maciez e impetuosidade e, claro, administrar a digestão... pois não é brincadeira. Mas, sem medo, ergam seus pães, torradas e damascos e mandem bala, porque quem não petisca, não arrisca. O que é matar e morrer pela vida, esse queijo nobre? Tamanha reflexão justificaria até trocadilhos infames! O Gorgonza, como tudo – sim, como tudo –, tem seu preço. Mas a vida não é barata e o queijo não é fácil. Man
ja?

quinta-feira, 14 de maio de 2009

maçã na cabeça a 50 passos de distância


Esse é o início da picada, a primeira mancha de calor púrpura que aparece no meu detector ótico na hora duma escolha dita importante. E, note, sem juízo de valores quanto ao certo ou errado. O drama é o alvo ilegível, a tensão nervosa, a dificuldade do tiro, e não necessariamente a salvação buscada, podendo ela ser a fruta, a face, o tronco, o vazio ou até mesmo a unha do dedo mindinho do próprio pé.

Não importa o quão safo és com o arco e quão treinada é tua mira. Macaco velho pode até ter um tiquim de virtuosismo a mais nas sobrancelhas ou talvez uma bamboleadazinha no canto do bigode que pode fazer a diferença na estocada final, mas garantia de gomo partido ao meio e semente triscada à mostra, aquela garantia com carimbo do cacique-mór e benção de Oxóssi e tudo, isso ele não tem.

E eu, bicho sortudo do meio termo social, com certa oportunidade de vislumbrar o gol, acertar o bandeirinha e não ter perigo de ter mamãe tacada na esquina, é que não tenho mesmo. Nessas horas críticas, ou cínicas, pra falar como o bom e velho mestre da música paulistana João Rubinato, sou duma descoordenação motora e psíquica que benzadeus. Faltou o Tell no meu nome. E sobrou a besta.

A questão é que sempre meço de três jeitos diferentes, intercalo as coincidências teóricas com as reminiscências práticas, tiro prova dos noves fora, passo noites num alerta só, ou porque tenho quentura de provação, ou porque vou pros botecos umedecer os dedos, fazer enquetes e bolar estatísticas qualitativas, levando em conta, obviamente, as condições de temperatura e pressão dos pobres opinantes no momento exato da expressão facial que leva ao voto.

E, ainda assim, no geral, vejo-me escorrendo pro miolo da circunferência do engano. Ora o sono atrasado faz-me insolente e indolente, ora a ressaca eleva minha inefável displicência e multiplica as projeções imaginativas que não levam a lugar algum. E o pior é que a percepção nascente do equívoco abrilhanta-se em pleno ato, nem antes, nem depois, quando a boca catatoniza o cérebro num jogo brancocoloridobrancocoloridobrancocolorido e fudeu. Lá se vai a roda do carro ralando na guia. Na ida e na volta.

E aí, ainda que não seja vergonhoso voltar atrás e/ou por baixo e/ou à margem, decido que o mais propício é mudar de fase, com nova vida e novos pontos, faça chuva ou faça sol. E assim sigo a pular capôs e sarjetas, desafiar a insanidade, a política, o mercado e a crise, e caçar tesouros, como num pitfall urbano. Bifurcação é diabo quem bota, só pode ser. E é por essas e outras que sigo agnóstico, quase sincrético, quase ateu.

Enfim, acabo de escolher que agora terei um blog, mesmo com total consciência da incapacidade de gerir esse lixo pessoal por muito tempo. E o que isso tem a ver com opções, decisões, gatilhos, erros e acertos, cabe à meia volta que dei em plena marcha feliz. De um jeito ou de outro, agora me vejo de novo escrevinhador e, por consequência, já que assim foi estabelecido por autoridade, fingidor. No fundo, estou só tomando distância pra mais uma burrada. E vai curíntia!